Carta aberta a meu pai

Postado por Belarmino | 10:37 | | 4 comentários »

Te amo. É a primeira coisa que quero te dizer depois desse tempo todo. É, eu não tinha te dito isso antes de você partir, mas não porque eu não quis e sim porque não deu.
As lembranças sempre me inundam de orgulho. Orgulho de um homem que fez de tudo para sobreviver, de um homem que fez de tudo para dar o melhor a seus filhos, e conseguiu.
Eu era muito novo, lembra? Tinha onze anos e não estava nem em casa, nem na cidade. Estava na minha vó, minha mãe achou melhor levar eu e meus irmãos para lá, para nos proteger. Eu sabia o que estava por vir, e eu, apesar de muito novo, era o mais velho dos irmãos. Eles não estavam entendendo muito bem o que estava acontecendo, só caiu a ficha do Gabriel quando nós chegamos lá e dá Fer, só um dia depois. E eu nem pude te dizer que te amava. Claro que você sabia, mas eu não disse, o Gabri também não disse e a Fer também não, mas você sabe né? Nós te amamos.
Eu lembro que você chegava em casa, cansado do trabalho, e ia jogar bola comigo e dizia: "Você não pode me vencer, eu sou o rei do futebol." Você era o rei de tudo, sempre. Você me levava para pescar, e nem gostava de pescar, e também dizia que era o rei da pescaria. Eu sempre te achei meu rei. Você era gigante, enorme. Você era forte. Corinthiano roxo e deixou isso de herança para mim.
Trabalhador incansável.
Você era o meu rei, era o rei da minha família. Você é o meu rei.
Eu lembro quando estávamos na festa junina lá do objetivo, lembra? Meu par era alguma menina que eu não gostava, fiquei escondido lá no fundo para ninguém me ver com ela.
Você passou mal na festa, fomos para casa e alguns dias depois minha mãe estava chorando e dizia que você tinha alguma coisa que se chamava câncer. Eu não sabia o que era isso, eu só via que você estava magro, fraco e mesmo assim continuava a ser o rei de tudo. Corria, me jogava no ar, fazia malabarismo com o prato e minha mãe ficava brava com isso. Nessa época eu só tinha 9 anos e via meu heroi, meu rei, fraquejar. Não foi fácil. Como podia você, o homem mais forte do mundo, ficar abatido daquela forma? Como podia o meu rei do futebol não conseguir mais jogar? O rei da pipa não conseguir mais empinar? O rei da bicicleta não conseguir mais pedalar?
Não sabia o que estava acontecendo, naõ mesmo. Mas você lutou muito, não é?
Sabe, pai. Você é meu heroi, meu rei, meu pai. Tenho orgulho de dizer quem foi meu pai, que foi esse bravo guerreiro, que brigou durante 1 ano e meio contra uma doença mortal, que deixou tudo do bom e do melhor para a sua família, que sempre se preocupou comigo e com meus irmãos.
Pai, eu te amo.

4 comentários

  1. Annelize Tozetto // 25 de junho de 2009 às 10:41  

    É meu amigo... eu sei bem como é ter alguém com câncer em casa... meu pai teve e lutou dez anos com essa doença. E as coisas acontecem assim, muito rápido mesmo... quando a gente menos percebe, eles se foram e a gente demora a passar - ou nem tanto- que eles são tudo que nos importa nessa vida...
    Nossos pais estão bem, batendo maior papo, acredite, nisso.
    Beijocas

  2. Dan! // 6 de julho de 2009 às 23:49  

    Incrível. Clica ali, clica de lá no twitter... Parei aqui. Creio não o conhecer, porém, achei incrível. Por não ter palavras melhores para definir essa postagem, permaneço no "simples" incrível. Incrível como alguém pode definir tão bem um amor tão profundo quanto esse que nós filhos, temos pelos nossos pais. Pais que podem errar, podem vacilar, mas sempre serão "nossos heróis, nossos bandidos", como já dizia a canção. Valiosos. Destemidos. Impetuosos. Sinto muito o fato de você não ter tido mais tempo com seu pai, acredito que ele gostaria de saber de tudo isso. E acredito que ele se orgulharia muito de saber que teve sua missão cumprida. Compartilho da mesma admiração desmedida pelo próprio pai e, espero um dia, que tanto eu, quanto você, quanto tantos outros garotos que tem ou tiveram a chance de entender esses amigos/tutores/heróis possamos nos tornar ao menos um leve reflexo na água dos mesmos.

  3. Gabriel Acc Tripode // 17 de setembro de 2009 às 14:09  

    Nossa, Vi... gostei muito desse texto!

  4. Jorge Luiz // 13 de agosto de 2012 às 13:23  

    Meu querido primo,
    Seu pai não foi somente um rei, ele foi muito mais do que isso, ele foi Homem, Honesto, Honrado e acima de tudo Humano, eu diria uma pessoa com quatro H’s não maiúsculos, mas H’s Gigantes, assim como ele era.
    Trabalhamos juntos na CESP, quando ele veio a SP fazer os exames dele, veio junto com o seu tio Claudio (meu primo de primeiro grau), eu também passava por um problema no fígado, porém, era uma migalha perto do problema dele, brincávamos muito dizendo que tudo ia passar e logo ele estaria bom.
    Mas sabe de uma coisa, às vezes o Criador nos prega essas peças, duro de engolir e aceitar, mas com algum propósito, nunca sem propósito, às vezes o Criador precisa de pessoas como seu pai para auxilia-lo na construção do Universo, por isso ele o levou, pois precisava de um ser humano com os quatros H’s gigantes para melhorar outros espíritos tão carentes de algo nobre.
    O Criador também reservou a você e seus irmãos, missões neste planeta, façam como seu pai, sejam também um ser de quatro H’s Gigantes.